Discurso no Ato de mobilização a comemoração ao Dia Mundial sem Tabaco da Subsecretaria Antidrogas da Secretaria de Estado de Desenvolviemento Social e Esportes do Governo de Minas Gerais

BANCO CENTRAL DO BRASIL

31-MAIO-2006 – DIA MUNDIAL SEM TABACO

PALESTRANTE: ADIR DE CASTRO
PRESIDENTE DA ANACOTA – ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE COMBATE AO TABAGISMO

Meus senhores e minhas senhoras,

Certa vez um rato, olhando pelo buraco da parede, vê o fazendeiro e sua mulher abrindo um pacote. Ficou aterrorizado quando descobriu que do pacote saiu uma ratoeira. Rapidamente foi para o pátio da fazenda e passou a advertir a todos:
- Tem uma ratoeira na casa, uma ratoeira na casa, dizia ele. A galinha que estava cacarejando e ciscando, levantou a cabeça e disse: desculpe-me sr. Rato, eu entendo que é um grande problema, mas não me prejudica em nada, não me incomoda.
- O porco, por sua vez afirmou: desculpe-me sr. Rato, mas não há nada que eu possa fazer, a não ser rezar. Fique tranqüilo que o senhor será lembrado nas minhas orações.
- O rato então dirigiu-se à vaca. Ela disse:
- O quê, senhor rato? Uma ratoeira? Por acaso estou em perigo? Acho que não !
O rato voltou para casa cabisbaixo e abatido, pronto para encarar seu destino.
Naquela noite ouviu-se um barulho, como o de uma ratoeira pegando sua vítima. A mulher do fazendeiro correu para ver o que havia capturado.
No escuro, não viu que a ratoeira pegou a cauda de uma cobra venenosa, que a picou.
Imediatamente o fazendeiro levou a mulher ao hospital. Mas ela voltou com febre.
Todo mundo sabe que para alimentar alguém com febre, nada melhor que uma canja. Aí o fazendeiro pegou seu cutelo e foi providenciar o seu ingrediente principal.
Como a doença da mulher continuava, os amigos e vizinhos vieram visitá-la. Para alimentá-los, o fazendeiro matou o porco.
A mulher não melhorou e acabou morrendo. Muita gente veio para o funeral. O fazendeiro então teve que sacrificar a vaca para alimentar todo aquele povo.
MORAL DA HISTÓRIA – Quando da próxima vez que você ouvir dizer que alguém está diante de um problema e acreditar que aquele problema não lhe diz respeito, lembre-se que quando alguém corre risco, todos correm.
Senhores e senhoras,
É, por ter a certeza de que a questão do cigarro é um problema de todos nós, que eu tenho a honra de estar aqui, hoje e agora, diante desta distinta platéia, sem dúvida nenhuma, formadora de opinião.
Tenho tentado, ao longo dos últimos 20 anos, sem nunca, em tempo algum, ter fumado um só cigarro, convencer governos, autoridades sanitárias, pessoas comuns, fumantes ou jovens iniciantes.
Sou um homem sonhador. Na verdade, sou movido a sonhos. Até porque, se não o fosse, jamais estaria aqui, diante de vocês, pois existem poucos sonhos tão altos quanto fazer com que principalmente os jovens evitem as primeiras assassinas tragadas.
Não temo o juízo externo, nem as palavras de desencorajamento que muitas vezes ouço, por tudo que tenho feito e conseguido, render graças a Deus. Esta missão que Deus me confiou eu a carrego com muita disposição e alegria.
Já vivi época ainda mais difícil. Quando a utopia invadia pela televisão nossos lares, aliciando todos e aos nossos filhos para o caminho do cigarro. Campos verdes se perdendo no horizonte, riachos de água cristalina, bosques, cavalos selvagens livres, em galope, naves e aeronaves. Impossível não desejar estar lá. Logo depois, por alguns segundos na tela, o aviso: o ministério da saúde adverte: fumar pode causar câncer, fumar pode causar doenças cardiovasculares, fumar pode causar enfisema pulmonar, etc... Trata-se de verdade comprovada cientificamente. Os anúncios seduziam pela beleza, mas mentiam, terrivelmente, ao sugerir que o cigarro seria o caminho para a beleza desejada, para o sucesso ambicionado. Conheci poucas pessoas, que tenham sido convencidas pela ciência. Conheci muitas, entretanto, que foram, mortalmente seduzidas pela beleza da imagem e que consequentemente não mais estão entre nós. A televisão sabe disso: as pessoas não são movidas pela verdade, são movidas pela beleza.
Mas nós nascemos com a beleza que pode seduzir o povo, fazê-lo amar a natureza, preservar a saúde, alegrar-se com as artes, com os esportes, cuidar das crianças, viver a vida de forma civilizada, enfim, respeitar a vida.
Nós não temos a pretensão da sabedoria da ciência, tão cheia de pesquisas e verdades, que sabe levar o homem à lua, mas não sabe como faze-lo, amar a si próprio. Não fumar, não usar as outras drogas é amar a si próprio, é amar sua mulher, seus filhos, seus semelhantes. É não fazer que seu amigo, vizinho ou colega de trabalho, não fumante, tenha que respirar a mortal fumaça que você expira.
Entretanto, graças a sensibilidade e determinação do então deputado federal professor José Elias Mura, lutando contra a apatia dos seus pares e do poder econômico, finalmente em 1 996 foi aprovada Lei Federal n. 9294, regulamentada pelo Decreto 2.018, que em sua essência tem a finalidade de defender o não fumante, pois, estabeleceu limites nos lugares públicos para os fumantes.
Graças àquela Lei Federal que fundamentou ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul, proibiu-se o fumo nos aviões, fazendo com que as viagens aéreas deixassem de ser um castigo para os não fumantes.
Ainda, entre outras, criou-se a obrigação de que seja estampada, em cada maço de cigarro frases, e figuras que alertam os compradores do cigarro dos males que causa.
Entretanto, esta última obrigação acabou se tornando objeto de chacota pelos fumantes e pior, muniu os tribunais de argumentos para não condenar a indústria do cigarro às indenizações pedidas por eles e pelos seus familiares.
Em Belo Horizonte, a Câmara Municipal aprovou a Lei n. 6 861 que também regula o hábito de fumar nos recintos coletivos.
Já a Assembléia Legislativa de MG aprovou o projeto que se transformou na Lei n. 12.903 que mantém a mesma linha, mas que desafortunadamente não é respeitada nem mesmo na própria Assembléia.
Lamentavelmente, nenhuma delas pouco funcionou. A questão que deveria ser estritamente de saúde, transformou-se em questão política. Apenas um exemplo: a prefeitura de Belo Horizonte não fiscaliza a proibição do fumo nos shoppings, simplesmente porque aqueles estabelecimentos, ficaram em sétimo lugar, no volume de doação de recursos para a campanha da eleição do prefeito Pimentel.
Os deputados e os vereadores, com exceção do Professor Murad, não se empenham junto ao executivo para compeli-lo a fazer cumprir as leis porque isto poderá causar-lhes a perda dos votos dos fumantes.
O Ministério público, tanto federal quanto estadual, aos quais já recorremos, se sentiram impotentes também para fiscalizar o cumprimento das leis. Não tiveram a mesma determinação dos mesmos órgãos do Distrito Federal ou do Rio Grande do Sul.
Enquanto isso, os estados teoricamente menos avançados que o nosso, tais como Espírito Santo, Sergipe, Bahia, e Distrito Federal, cumprem rigorosamente as leis proibindo o fumo nos shoppings.
Não posso deixar de citar o exemplo que o Ministério Público do Distrito Federal deu ao Brasil. Lá, o dr. Guilherme Fernandes Neto, apesar de toda a sorte de oposição ao seu trabalho de fiscal da aplicação das leis, conseguiu, finalmente o respeito de todos e em Brasília é hoje, junto com São Paulo e os demais estados, fumar em recintos coletivos página virada na história do combate ao cigarro.
Houve até o caso de um ministro de estado, casado com uma atriz, que foi instado a apagar o seu cigarro quando se encontrava numa das comissões do Congresso Nacional.
Agora, pasmem os senhores: o governo federal gasta com as doenças que o cigarro provoca o dobro do que arrecada pela produção e venda daquele veneno.
Não duvidem que seja veneno. Em cada cigarro poderão ser encontrados componentes também presentes em veneno para matar baratas, pulgas, ratos; em tintas para canetas e cabelo; até cadímio que é encontrado na bateria do carro que usamos. E mais outras 4.720 substâncias químicas. Tudo desenvolvido maquiavelicamente para tornar nosso sistema nervoso central escravo da droga que é a nicotina.
Não satisfeitos com tamanha crueldade e com a finalidade de atrair mais dependentes, pagam para atores e atrizes fumarem nas novelas, em filmes, em eventos. Ela, a indústria do cigarro, busca 11.000 novos fumantes, a cada dia, para substituir aqueles que morrem por doença tabaco-relacionada. Todos os dias, entre 82.000 a 99.000 adolescentes, mesmo crianças, começam a fumar. Há 4 milhões de mortes por ano. A não ser que lutemos muito, este número pulará para 10 milhões até 2.030.- No Brasil, atualmente, são 200 mil brasileiros que morrem por ano, vítimas de doenças provocadas pelo cigarro.
A Organização Mundial de Saúde estima que, aproximadamente, 700 milhões de crianças no mundo, isto representa a metade das que existem, estejam expostas à fumaça de segunda mão.
Além das altas taxas de prevalência entre os homens, surge uma outra preocupação: com o aumento do consumo de tabaco entre as mulheres e os jovens. Agora, mais do que nunca, há necessidade de lutarmos contra o marketing e as atividades promocionais da indústria do tabaco, que tem como alvo as mulheres e os jovens. O foco original da indústria do tabaco deslocou-se. Antes eram os homens dos países desenvolvidos, agora é a mulher nos países desenvolvidos e o homem nos países em desenvolvimento. Como resultado, hoje, na maioria dos países desenvolvidos, as mulheres fumam como os homens.
Mas pelo mundo afora, enquanto nossa legislação está estagnada, paralisada, não cumprida, não respeitada, pipocam leis inovadoras, modernas, atuais.
Vejam os senhores: a Tailândia, a Índia estão na vanguarda da luta contra o cigarro. Canadá, Estados Unidos, Noruega, África do Sul, Finlândia, Inglaterra, França avançam, dia a dia, no controle da praga que é o cigarro. Nos Estados Unidos, existem cidades onde só é permitido fumar na casa do fumante e em nenhum outro lugar.
Senhores e Senhoras,
Os antitabagistas fazem um bem à humanidade. Quanto menor o número de fumantes, melhor para todos nós.
Nós queremos fazer o bem também a nós mesmos. Temos o direito de respirar o ar puro. Segundo a ONU, o tabagismo é a maior causa de mortes do planeta.
Vejam que crueldade: em análises realizadas no Hospital Infantil de Toronto, foram encontrados traços de nicotina nas raízes de cabelos de recém-nascidos, simplesmente por que as mães, durante a gravidez conviveram com fumantes. E imaginem, os danos causados ao bebê quando as mulheres fumam e se fumam durante a gravidez.
Quero dedicar meus últimos minutos à mulher. Longe de todo glamour que a mídia produziu, a inebriante fumaça do cigarro é capaz de provocar sérias conseqüências, tanto quanto a feminilidade da mulher, como em relação à saúde dela e do filho, que eventualmente queira gerar. O tabagismo faz com que a mulher perca as características que lhe são peculiares. Todo o corpo fica com o cheiro dos cigarros consumidos, o que altera sua química individual, a faz perder aquele atrativo pessoal, intransferível e irresistível para os homens. A nicotina causa o envelhecimento precoce da pele, porque bloqueia os vasos sanguíneos e diminui a irrigação do corpo, desenvolvendo rugas com mais facilidade, além de deixar a pele extremamente ressecada. Faz ainda com que ela fique com voz de homem, pois, a fumaça do cigarro agride a laringe, inflama as cordas vocais e provoca mau-hálito.
Vamos, meus amigos, pensar como os estadistas: vamos pensar na próxima geração. E não como a maior parte dos políticos, que só pensam na próxima eleição.
Às vezes as pessoas me perguntam: Adir, você não tem medo das retaliações da indústria do cigarro? Digo que não. E não tenho mesmo. Penso como os inconfidentes: se tivessem medo da coroa portuguesa, provavelmente as sementes da independência não teriam sido plantadas. Assim como os bandeirantes penso que se tivessem medo, provavelmente nosso país não teria suas fronteiras alargadas.
Tenho medo sim, do governo que não remunera com dignidade seus funcionários, da cpmf que nunca foi utilizada para os fins para os quais foi criada; tenho medo do imposto sobre combustíveis que nunca foram devolvidos; tenho medo sim do presidente que tira da saúde 60 milhões de dólares para comprar avião, enquanto a população de baixa renda morre nas filas do SUS; tenho medo sim do presidente da república que fuma e em público, tenho medo sim do presidente da república que edita medida provisória suspendendo os efeitos da Lei Federal 9294 que proíbe o patrocínio de eventos culturais e esportivos pela indústria do cigarro,tenho medo sim de quem prega a honestidade e depois faz o mesmo que os anteriores faziam; tenho medo do Congresso Nacional que livra os mensaleiros das cassações, tenho medo sim, dos delúbios, dos marcos valérios, dos josé dirceus, dos genuínos, dos que recebem land-rover como propina, tenho medo sim, da nossa legislação penal e do seu código que urra como um leão diante do ladrão de galinhas e mia como um gato diante dos poderosos.
Muito obrigado !

Fonte: Anacota, em 01-06-2006.